quarta-feira, julho 14, 2004

PENSAMENTO DO DIA

"Um dia, a rosa encontrou a couve-flor e disse:
- Que petulância, se chamar de flor! Veja sua pele
áspera e a minha, lisa e sedosa. Veja seu cheiro
desagradável e meu perfume, sensual e envolvente. Veja
seu corpo grosseiro e o meu, delgado e elegante... Eu,
sim, sou uma flor!!!
E a couve-flor respondeu:
- É...mas ninguém te come."

Moral da História: De que vale ser bonita se não for
gostosa?
[um conto da carlinha]


A Vida em 35mm

Eu soube que ela me amava já no primeiro mês de namoro. Convidou-me à casa de sua avó, ela havia estado um pouco enferma, numa terça feira à tarde. Era 5 horas, horário de verão, o sol entrava pela janela da sala de estar, batendo no móvel antigo e nos livros já amarelados. Aquele sol amarelinho entrando causou-me uma sensação tão confortável, tão aconchegante, eu apenas me senti feliz. Acho que toda “casa de avó” já deve ter, por natureza, um ar acolhedor, aconchegante, mesmo que não seja o lar da minha avó. Avós são seres fantásticos, podemos contar para elas o que não contamos sobre nossa vida para nossa própria mãe, elas te compreendem e ainda dizem: “isso mesmo! Viva sua vida da melhor maneira possível, pois o tempo passa, minha filha. E quando você menos espera está cercada de memórias da juventude, livros todos lidos e gatos velhos e preguiçosos”.
Após o cafezinho com bolo, perguntas sobre minha família (os mais velhos julgam os mais novos de acordo com a índole da família desses) e conversas sobre doenças, deixamos a casa da simpática vó Amparo e começamos a andar em direção ao centro. O sol ainda estava lá, deveria ser umas seis e meia, agora batendo nos prédios, mas só nas janelas de cima, fraquinho, amarelinho. Ela começou a descrever como se sentia bem olhando para esse cenário, talvez remetesse a algo que não soube explicar direito, talvez a alguma memória da infância. Eu achei encantador o jeitinho dela falando toda empolgada e falei sobre o sol na sala de sua avó. Então ela pegou em minha mão enquanto ainda caminhávamos – era a primeira vez após um mês de namoro -, me olhou surpresa e disse:
- Onde você esteve esse tempo todo?
Deu-me um beijo no rosto, apertou minha mão mais forte entrelaçada na sua e continuamos andando. A conexão estava feita.
Aquela frase ficou em minha cabeça, “onde você esteve esse tempo todo?”, como a mocinha diz para o mocinho depois de ele levá-la para um jantar à luz de velas e conquistá-la com seu charme num filminho romântico água-com-açúcar onde já deduzimos o final ao sermos introduzidos aos personagens nos primeiros dez minutos. Quando acontece algo em minha vida, uma situação, um momento, imagino “e se isso fosse uma parte de um filme, eu iria gostar de assistir?”. Se sim, significa que minha vida é legal. Então decidi: vou viver minha vida como se ela fosse um filme, quero a mocinha mais bonita apaixonada por mim, quero os clichês, quero um final feliz.
Duas semanas depois tivemos nossa primeira briga. Viajamos com uns amigos dela para o aniversário da sua melhor amiga. Na volta começamos a “brigar por pizza”, como dizia uma amiga minha, o que quer dizer mais ou menos como brigar por besteira, e deve ser como a expressão “tudo acaba em pizza”, que é quando uma situação séria se transforma em banalidade, em besteira. Era uma besteira, mas acabou me irritando. Desci no primeiro metrô, iria para a casa dos meus pais para passar dez dias, mal me despedi. Como toda ariana ela tem o gênio forte, portanto não pediu para eu não ir, então eu fui, de cara feia, mas fui. Comprei a passagem e ao entrar no ônibus meu celular tocou, era ela:
- Onde você está? Desce do ônibus agora!
Inventei para o motorista que eu estava passando mal e desci. Ela veio ao meu encontro chorando – era a primeira vez que eu a via chorar – dizendo que não queria que eu fosse embora por tanto tempo tendo brigado comigo. Disse que me amava – era a primeira vez que eu ouvia isso dela e para dizer a verdade, era a primeira vez na vida que eu ouvia com tanta sinceridade – e me fez prometer que não a deixaria nunca mais. Puro clichê cinematográfico (era tudo o que eu queria) então eu prometi e tenho cumprido a promessa. Estamos namorando há cinco anos.
Passamos por várias dificuldades: brigamos e choramos, terminamos e voltamos, nos xingamos e nos magoamos, mentimos e traímos, mas nada quebra a conexão. A conexão começada pelo sol. Sempre me lembro dela num dia bonito, mesmo quando estou longe, ligo e digo:
- Olha que solzinho gostoso. Queria estar com você.
Seremos felizes enquanto o sol brilhar. A noite vai demorar a chegar.