Encontraram-se no ponto de ônibus.
Era domingo de manhã bem cedo, o sol já ia alto naquele dezembro conturbado, daquele ano que parecia que nunca terminava, e que também quando terminasse, ia começar o que? Esperavam em silêncio o ônibus. Não tinha ninguém na rua, as pessoas já estavam em casa, viradas da balada, emendadas do sábado que só termina quando se dorme.
Tuca pensou em dizer alguma coisa. Pensou em frivolidades. Em comida, em sonhos. Mexia os pés, olhava os tenis velhos e sem querer se perdeu nos pensamentos, no ponto de ônibus vazio, na cabeça vazia, no coração apertado. Deitou a cabeça no ombro de Helena e fechou os olhos.
Helena estremeceu. Tinha vindo caminhando desde sua casa pensando que tinha que ser forte. Repetiu isso pra si mesma três vezes, e três vezes teve a certeza que seria, mas agora estremecia, e toda a certeza que teve que seria forte se desmanchava em saudades. Ser forte não fazia mais sentido, era só aquilo, era só um dia de sol, era só o ônibus que teimava em não
passar, era só o tempo que teimava em não curar as mágoas e atenuar as saudades das pessoas que um dia já se deram tão bem como café com leite, e já se magoaram tanto quanto o tanto amor que já havia passado por ali.
Veio o ônibus, preguiçoso pela Rebouças vazia, deslisando no asfalto que tremia sob o sol, sem pressa de chegar. Quando Tuca se levantou, Helena inconscientemente achou uma pena aquele momento acabar e já sentiu falta daquela cabeça no seu ombro.
Chegaram no parque. Ouviam ao fundo a cantora cantar, as crianças correrem, as pessoas conversarem, e sem combinar continuaram andando, andando, até as vozes de fundo desaparecerem, os cachorros sumirem, as crianças ficarem para trás e só sobrar a grama verde silênciosa, cheirando a domingo de manhã.
Helena parou e deitou. Tuca parou também deitou, oposta a Helena, só as cabeças se encostando. Tete-a-tete, rosto-a-rosto. Respirando o mesmo ar.
- Helena. E se o tempo passasse? E se a gente fechasse os olhos e anos se passassem, sem que a gente percebesse?
- ....seria ótimo.
As duas fecharam os olhos e esperaram o tempo passar, indolor, inofensivo, como deveria ser.